domingo, 11 de março de 2012

Endometriose: um problema nutricional?

Endometriose é uma desordem ginecológica, crônica, estrógeno dependente, associada, frequentemente com dor pélvica e infertilidade, afetando cerca de 3-10% das mulheres em idade reprodutiva (OLIVE; SCHARTZ, 1993; OMWANDHO et al., 2010; WANG et al., 2011).
Embora nos últimos anos tenham sido publicados vários trabalhos acerca da doença, ainda que a nível epidemiológico, Petta et al. (2007) chamam a atenção para as sérias consequências no atraso do diagnóstico, indicando que as condições de saúde das mulheres podem piorar muito. Entretanto, não há evidencias científicas que justifique o porquê deste atraso.
A endometriose pode ser definida como a presença de glândulas endometriais e estroma (tecido conjuntivo) fora da cavidade uterina. Os locais mais afetados são os ovários e a cavidade abdominal, mas outros sítios já foram reportados na literatura, incluindo o septo retro-vaginal, pericárdio, pleura ou até mesmo no cérebro (GIUDICE; KAO, 2004).
O diagnóstico da doença é feito por meio de intervenção laparoscópica seguida da confirmação histológica das glândulas endometriais ectópicas. Em relação à patogenia da endometriose, muito ainda é discutido. Uma das hipóteses atribuída é a da menstruação retrógrada, onde fragmentos do endométrio descamado seguiriam para as tubas uterinas ao invés do canal vaginal, mas esta hipótese vem sendo questionada por não apresentar explicação de como a menstruação retrógrada, um processo fisiológico corriqueiro, não causa endometriose na maioria das mulheres (SIMPSON et al., 2003; BARLOW; KENNEDY, 2005; GENTILINI et al., 2008).
Outra teoria associada é de que fatores genéticos estejam presentes, embora ainda não tão compreendidos. Simpson et al. (2003) mostraram um risco de 4 a 7% para a doença em parentes de primeiro grau, indicando que a endometriose seja uma doença poligênica e multifatorial.
Fatores nutricionais tem sido alvo de discussão como prováveis indutores de endometriose, mas não existem trabalhos científicos suficientes para apoiar tal teoria. O trabalho de Covens et al. (1988) é um dos poucos estudos experimentais que sugere que o óleo de peixe poderia contribuir para a regressão do endométrio ectópico. Mais recentemente, Parazzini et al. (2004) publicaram um estudo confirmando a relação entre endometriose e o consumo de carne vermelha e, inversamente o consumo de vegetais verdes e frutas.
Outra linha de pesquisa, crescente, sugere relação entre os fatores fisiológicos possivelmente associados à endometriose e o consumo de alimentos. Por exemplo, contratilidade do músculo não-estriado, níveis de estrogênios, inflamação, metabolismo de prostaglandinas e periodicidade menstrual são alguns fatores que contribuem para endometriose e podem ser influenciados pela dieta (BAER et al, 2004; MISSMER et al, 2010).
Outro ponto importante que devemos mencionar aqui é em relação ao tratamento da endometriose. As técnicas disponíveis atualmente incluem excisão cirúrgica por vídeo laparoscopia e administração de vários medicamentos, tais como: análogos do GnRH (Hormônio Liberador de Gonadotropina), inibidores de aromatase, progestatinas, esteroides contraceptivos, andrógenos e antiinflamatórios não esteroidais (AINEs). Infelizmente, esta gama de tratamento tem ações limitadas devido ao alto índice de efeitos colaterais. Então, a busca por tratamentos novos, eficazes, seguros e de uso contínuo ainda vem sendo pesquisada.
Um possível candidato no tratamento da endometriose é o resveratrol, um polifenol encontrado nas uvas, nozes e no vinho tinto. Segundo Bruner-Tran et al. (2011), em sua pesquisa com ratas,  o uso do resveratrol diminuiu o número de focos de endometriose em 60% e o volume total de lesões em 80%.
Outro aliado no tratamento da endometriose é o puerarin, um fitoestrogênio derivado da planta Chinesa Radix puerariae. Seu uso tem sido associado com doenças cardiovasculares, alcoolismo e doenças neurológicas (HWANG; JEONG, 2008; BOONCHIRD et al., 2010). Wang et al. (2011), em seu estudo, demostrou que o uso do puerarin pode suprimir a invasão de órgãos por tecido endometrial ectópico.
Podemos concluir, portanto, que mesmo com poucos dados que confirmam a participação dos alimentos tanto na indução quanto no tratamento da endometriose, é fato que o nutricionista vem ganhando destaque em áreas mais específicas da medicina como ginecologia e reprodução humana, aliando o conhecimento das ciências dos alimentos em prol da saúde das pacientes.

Maurício Pereira Gouvinhas, Biólogo
Especialista em Sistema Reprodutor Feminino pela UNIFESP
Professor do Centro Universitário Lusíada - UNILUS

Referências Bibliográficas

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BARLOW, D.H.; KENNEDY, S. Endometriosis: new genetic approaches and therapy. Annu Rev Med. v. 56, p. 1635-39, 2005.

BOONCHIRD, C.; MAHAPANICHKUL, T.; CHERDSHEWASART, W. Differential binding with ERalpha and ERbeta of the phytoestrogen –rich plant Pueraria mirifica. Braz J Med Biol Res. v. 43, p. 195-200, 2010.

BURNER-TRAN, K.L.; OSTEEN, K.G.; TAYLOR, H.S.; SOKALSKA, A.; HAINES, K.; DULEBA, A.J. Resveratrol inhibits development of experimental endometriosis in vivo and reduces endometrial stromal cell invasiveness in vitro. Biol Reprod. v. 84, p. 106-12, 2011.

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MISSMER, S.A.; CHAVARRO, J.E.; MALSPEIS, S.; BERTONE-JOHNSON, E.R.; HORNSTEIN, M.D.; SPIEGELMAN, D.; BARBIERI, R.L.; WILLETT, W.C.; KANKINSON, S.E. A prospective study of dietary fat consumption and endometriosis risk. Hum Reprod. v. 25, n. 6, p. 1528-35, 2010.

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WANG, D.; LIU, Y.; HAN, J.; ZAI, D.; JI, M.; CHENG, W.; XU, L.; YANG, L.; HE, M.; Ni, J.; CAI, Z.; YU, C. Puerarin suppresses invasion and vascularization of endometriosis tissue stimulated by 17-β estradiol. PLoS ONE. v. 6, n. 9, p. 1-6, 2011.



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