domingo, 5 de fevereiro de 2012

Aspectos nutricionais na Síndrome do Ovário Policístico

A Síndrome do ovário policístico (SOP) é classificada como um distúrbio endócrino, bastante comum em idade reprodutiva. A referida síndrome possui como características principais anormalidades menstruais, hiperandrogenismo (YARAK et al., 2005), alterações da razão LH:FSH (>2/3:1)  e ovários policísticos (NAVES, 2010), conforme descritas na postagem anterior.
Em função da resistência à insulina e do hiperandrogenismo envolvido pode haver o aumento da lipólise estimulada por catecolaminas no tecido adiposo visceral. Por conseqüência, são liberados ácidos graxos livres na corrente sanguínea, podendo alterar o perfil lipídico de VLDL, triacilgliceróis, HDL e LDL (DIAMANTI-KANDARAKIS; PAPAVASSILIOU; KANDARAKIS, 2007).
A dieta das portadoras de SOP deverá ser individualizada, a fim de garantir todos os nutrientes necessários ao bom funcionamento do organismo, em especial para a melhoria do perfil insulinêmico, promoção de perda de peso, nos casos necessários, bem como normalização das concentrações séricas de lipoproteínas (LDL e triacilgliceróis, em especial).
Marsh e Brand-Miller no ano de 2005 afirmaram que o número de pesquisas com o manejo da dieta na Síndrome do Ovário Policístico ainda era pequeno, apesar do fato das modificações no estilo de vida, incluindo dieta, exercícios e perda de peso ter apresentado benefícios na SOP.
Alguns estudos constataram os benefícios da redução de peso de apenas 5 % do peso total sobre a redução dos níveis de insulina; melhora da função menstrual; redução dos níveis de testosterona, sintomas de hirsutismo (presença excessiva de pêlos pelo corpo)  e acne (PASQUALI et al., 2000; VAN DAM et al., 2002; CROSIGNANI et al., 2003; MORAN et al. 2003; GAMBINERI et al. 2004; MORAN et al. 2004; STAMETS et al. 2004 apud MARSH; BRAND-MILLER, 2005).

         Moran et al. (2003) em um estudo com mulheres com sobrepeso e com síndrome do ovário policístico, avaliaram a intervenção dietética nas concentrações de proteínas e carboidratos da dieta por 12 semanas com restrição energética de aproximadamente 1.400 kcal (6000 Kj/dia) e 4 semanas de manutenção do peso. Os participantes (n=28) foram divididos em dois grupos, sendo o primeiro com dieta rica em proteínas composta por 40 % de carboidratos e 30 % de proteínas e o segundo grupo de dieta baixa em proteínas (normoprotéica) com 55 % de carboidratos e 15 % de proteínas. Com a restrição energética, independente das concentrações de macronutrientes da dieta, houve melhora do perfil lipídico, resistência à insulina,  redução do peso (7,5%) e gordura abdmoninal (12,5%) dos participantes. A perda de peso gera melhoria dos parâmetros cardiovasculares e reprodutivos, sendo esta perda relacionada principalmente à influência da dieta sobre a resistência à insulina. A perda de peso dos participantes do grupo da dieta hiperprotéica resultou em menores benefícios endócrinos e metabólicos quando comparada ao grupo com dieta normoprotéica (15%).
       Kasim-Karakas, Cunningham e Tsodikov (2007) relatam que dietas hiperprotéicas em mulheres pode estimular a produção de testosterona e ser prejudicial, principalmente nas que tem susceptibilidade ao desenvolvimento da SOP.
        Segundo Marsh e Brand-Miller (2005) a perda de peso e o exercício físico são alterações que promovem a melhora da resistência à insulina. Porém, a modificação dietética, inclusive da qualidade, independente da perda de peso, também podem influenciar diretamente na resistência à insulina. Exemplo disso são os carboidratos de baixo índice glicêmico, que devem fazer parte da dieta de indivíduos portadores de SOP. O consumo diário de carboidratos com alto índice glicêmico promovem uma excessiva liberação de insulina, intensificando a resistência desta.
       Estudos em animais demonstram que uma dieta rica em gordura, particularmente gordura saturada, pode levar à resistência à insulina. Estudos em humanos são inconclusivos, possivelmente pela curta duração das pesquisas, assim como pelas amostras reduzidas (RICCADI; RIVELLESE, 2000).
Uma dieta pobre em gorduras e rica em fibras, caracterizada pela baixa ingestão de produtos animais e alta ingestão de vegetais pode influenciar na circulação enterohepática e reduzir os níveis hormonais (NAVES, 2010).
     A hiperinsulinemia está relacionada com a redução da síntese de Sex hormone-binding globulin (SHBG) no fígado, bem como das proteínas carreadoras dos fatores insulinóides (TEIXEIRA FILHO, 2002). Consequentemente, haverá maior concentração de hormônios sexuais livres, dificultando o transporte ao fígado para sua conversão a metabólitos que possam ser excretáveis pelo sistema urinário e fecal, após sua utilização nos órgãos alvos.
Compostos bioativos e nutrientes que estejam envolvidos nos processos de detoxificação do organismo, bem como, consigam modular os niveis hormonais poderiam auxiliar no tratamento de mulheres com SOP. As concentrações excessivas de hormônios na SOP também necessitam ser biotransformadas, para viabilidade de excreção. Segundo Naves (2010) nutrientes como magnésio, vitaminas do complexo B (B6, B12 e folato) são cofatores de enzimas envolvidas na conjugação e metilação do processo de detoxificação e importantes para o indivíduo com SOP.
Compostos bioativos como curcumina (açafrão), indol-30-carbinol (brassicas) e polifenóis da romã possuem propriedades detoxificantes, por atuar neste sistema (NAVES, 2010) e intensificar a biotransformação das substâncias que devam ser excretadas.
Alguns alimentos como o mel e própolis, linhaça e romã possuem a habilidade pela presença da crisina, lignanas e ácido elágico, respectivamente, de inibir a aromatase (NAVES, 2010), enzima responsável pela transformação da testosterona em estradiol, em função da elevada concentração de testosterona livre na SOP. Estradiol em excesso pode ser prejudicial, uma vez que este hormônio é um dos mais atuantes na multiplicação das células mamárias, sendo associado ao desenvolvimento de neoplasias de mama.
A acne, um dos sintomas mais característicos da SOP, possui grande associação com a carga insulinêmica dos alimentos e o consumo de alimentos com alto índice insulinêmico (açúcar, carboidratos refinados, leite, dentre outros), aumenta a produção de andrógenos, que estimula IGF-1 (fator de crescimento insulina-símile 1), predispondo a maior produção de sebo pelas glândulas sebáceas, sendo este um pré-requisito para a “instalação” da acne (CORDAIN, 2005). Logo, o cuidado com a alimentação, melhorando a resistência à insulina e priorizando alimentos com baixa carga insulinênica podem auxiliar no tratamento das erupções da pele.
Cuidados com a hipercolesterolemia também tem sido enfatizados pelos estudos científicos. Ressalta-se, portanto, a utilização das fibras, em especial, a inserção de fibras solúveis na alimentação como farinha de casca de maracujá, farinha de laranja, farinha de psillium, farinha e/ou biomassa de banana verde, dentre outras fontes, ou mesmo mix de fibras industrializadas. Associado a isto, a utilização de probióticos tem contribuído na inibição da produção endógena de colesterol, em função da fermentação dos prebióticos e produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) (GUO; ZHANG, 2010), havendo outras hipóteses para essa redução, que são bem definidas na Revisão “Cholesterol-lowering effects of probiotics”  dos referidos autores. 
A avaliação da paciente deve contemplar um planejamento de dieta individualizada, respeitando suas carências nutricionais e propondo uma suplementação, caso haja necessidade, após o devido diagnóstico do estado nutricional. Dessa forma, enfatiza-se aqui a importância do nutricionista na equipe interdisciplinar para tratamento de indivíduos com Síndrome do Ovário Policístico, sendo a dieta uma grande aliada na melhora dos sintomas indesejáveis dessa Síndrome.



Karina Nunes de Simas
Nutricionista
Mestre em Ciência dos Alimentos

                                                                                               Pós graduada em Nutrição Clínica Funcional 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


CORDAIN, L. Implications for the role of diet in acne. Semin Cutan Med Surg. v.24, p.84-91, 2005.

DIAMANTI-KANDARAKIS, E.; PAPAVASSILIOU, A.G.; KANDARAKIS, S.A.; CHROUSOS, G.P. Pathophysiology and types of dyslipidemia in PCOS. Trends Endocrinol Metab. v.18, n.7, p.280-285, 2007.
           
GUO, C.; ZHANG, L. C. Cholesterol-lowering effects of probiotics – a review. Wei Sheng Wu Xue Bao. v..50, n.12, p.1590-1599, 2010.

KASIM-KARAKAS, S.E.; ALMARIO, R.U.; GREGORY, L.; WONG, R.; TODD, H.; LASLEY, B.L. Metabolic and endocrine effects of a polyunsaturated fatty acid-rich diet in polycystic ovary syndrome. Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. v.89, p.615-620, 2004.

KASIM-KARAKAS, S.E.; CUNNINGHAM, W.M.; TSODIKOV, A. Relation of nutrients and hormones in polycystic ovary syndrome.American Journal of Clinical Nutrition. v. 85, n.3, p.688-694, 2007. 
MARSH; K.; BRAND-MILLER, J. The optimal diet for women with polycystic ovary syndrome? British Journal of Nutrition. v.94, p.154–165, 2005.

MORAN, L.J.; NOAKES, M.; CLIFTON, P.M.; TOMLINSON, L.; NORMAN, R.J. Dietary composition in restoring reproductive and metabolic physiology in overweight women with polycystic ovary syndrome. Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. v. 88, p.812, 2003

NAVES, A. Nutrição  Clínica Funcional: Modulação Hormonal. 1ª ed. São Paulo: VP Editora, 2010.

RICCARDI, G.; RIVELLESE, A.A. Dietary treatment of the metabolic syndrome – the optimal diet. British Journal of Nutrition. v. 83, n. 1, p.143–p.148, 2000.

TEIXEIRA FILHO FL, BARACAT EC, LEE TH, SUH CS, MATSUI M, CHANG RJ, SHIMASAKI S, ERICKSON GF. Aberrant expression of growth differentiation factor-9 in oocytes of women with polycystic ovary syndrome. Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism.v.87, n.3, p.1337-1344, 2002.  

YARAK, S. et al. Hiperandrogenismo e pele: síndrome do ovário policístico e resistência periférica à insulina. An. Bras. Dermatol. v.80, n.4, 2005. 

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